1 ano de guerra: “Não está descartada a utilização de armas nucleares táticas contra a Ucrânia”, avalia especialista do CEUB
Luciano Munõz traça um panorama da guerra entre a Rússia e Ucrânia, avaliando os desdobramentos e principais impactos para a política internacional
Em 24 de fevereiro de 2022, o mundo se deparou com o início de uma guerra que perdura até hoje entre a Ucrânia e a Rússia. O pedido do governo ucraniano para ingressar na Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), devido às movimentações russas ao longo de sua fronteira, transformou as ameaças por parte da Rússia em invasão ao território ucraniano, contra o atual presidente Volodymyr Zelenskyy. Luciano Muñoz, professor de Relações Internacionais do Centro Universitário de Brasília (CEUB), avalia os impactos e desdobramentos causados pela guerra em todo o mundo. Segundo ele, o atual cenário indica que o conflito deve escalar e se prolongar.
“A Rússia está preparando uma nova ofensiva na região do Donbas. É possível que ocorram novos ataques no norte da Ucrânia a partir de Belarus. Por sua vez, a Ucrânia está recebendo tanques da Alemanha e dos Estados Unidos para a contra-ofensiva. A Ucrânia almeja retomar todos os territórios ocupados”, afirma.
Sobre o pedido da Ucrânia para entrar na OTAN, considerado o estopim do conflito, Luciano explica que o país busca o princípio da segurança coletiva: se um membro da aliança for atacado, os demais devem vir em seu socorro. Motivo pelo qual a guerra em curso pode ser considerada uma “guerra por procuração”. A OTAN enfrenta a Rússia indiretamente a partir do auxílio em dinheiro e armamentos que envia à Ucrânia, sem os quais ela já teria sido derrotada. Até então, a Ucrânia recebe apenas equipamentos necessários à sua defesa e eventual recuperação dos territórios invadidos.
Já no âmbito da segurança internacional, o especialista acredita que a guerra minou a confiança construída entre o Ocidente e a Rússia desde o fim da Guerra Fria. Ele afirma, que desde a década de 1990, a OTAN tem expandido seu guarda-chuva de segurança em direção à Europa Oriental, incluindo antigos países da “cortina de ferro” e ex-repúblicas soviéticas. Em 2008, a Rússia invadiu a Geórgia como tentativa de recuperar sua antiga área de influência. “Em 2014, houve a anexação da Crimeia. Nos dois casos, o Ocidente efetuou uma política de apaziguamento, quase não reagindo ao avanço russo na suposição de aquele fosse o limite”, ressalta.
“A guerra pode ser um primeiro passo em direção ao estabelecimento de uma nova ordem mundial defendida por Rússia e China. Ambos os países defendem o fim da unipolaridade norte-americana na segurança internacional para que possam estabelecer suas próprias áreas de influência”, afirma Luciano. As articulações envolvem a economia internacional, quando a aposta era a de que a interdependência entre União Europeia e Rússia na produção e consumo de gás natural refrearia o expansionismo russo, mas isso não se efetivou durante a guerra.
Segundo o professor, os discursos dos presidentes também subiram o tom ao longo do ano. Muñoz considera que a visita de Joe Biden à Ucrânia foi muito significativa e seu discurso indica apoio incondicional à Ucrânia, reiterando que Vladimir Putin é o único responsável pela continuação do conflito. Além disso, um pacote de ajuda à Ucrânia foi anunciado nesse último discurso – indicando que os apelos de Zelensky por mais ajuda e mais armamentos têm surtido efeito mesmo após um ano de conflito.
“No momento, nem Estados Unidos nem Europa têm interesse em pressionar a Ucrânia por concessões territoriais em prol de um cessar-fogo. Do outro lado, Putin ainda considera que a OTAN é a responsável pelo conflito por ter avançado em direção à área de influência russa, anunciando a saída da Rússia do Acordo START com os Estados Unidos, voltado ao controle dos arsenais nucleares,” prevê.
Sobre o cessar-fogo na Ucrânia, o docente do CEUB acredita que ainda é cedo para qualquer prognóstico. A rigor, a Rússia sequer declarou guerra à Ucrânia, pois considera que sua invasão é uma “operação especial”. Assim, a obtenção de um cessar-fogo já seria um grande ganho. “Tudo indica que, mesmo com um cessar-fogo na Ucrânia, a ruptura entre a Europa e a Rússia veio para ficar, ao menos enquanto Putin permanecer no poder”, arremata.